Amamentação e um pesadelo de 3 meses

Sou uma defensora da amamentação, fiz questão de amamentar os dois mais velhos até aos 24 meses e tenciono fazer o mesmo com a mais pequena. Mas amamentar não é sempre fácil, é efetivamente um desafio. Quando corre bem está tudo bem e é maravilhoso, mas quando não corre consegue ser muito extenuante e até doloroso.

Uma das consequências inicias que tive quando comecei a amamentar foram os olhos secos. No Luxemburgo foi diagnosticado tudo e mais alguma coisa, porque eu via bem e não percebiam porque me queixava de ver baço. Depois de hidratar os olhos com gotas e pomadas cheguei à conclusão que o melhor era aumentar radicalmente a água consumida e foi a melhor medida que tomei. A amamentação consome-nos muita água e se com a segunda filha já me obrigava a beber água, na terceira impus-me inicialmente a beber 4 garrafas de água por dia, 6L de água. Não gastava plástico porque enchia todos os dias as 4 garrafas com água filtrada da torneira. A conclusão foi que enquanto tive essa grande disciplina não senti um único dia os olhos secos. Depois dos seis primeiros meses deixei de controlar o volume de água que bebia, tentava, e tento, no entantoter sempre água para que ao mesmo tempo que perco a água a reponha. As pessoas mais velhas dizem que não se pode comer nem beber enquanto se amamenta, são mitos antigos. Lembro-me perfeitamente de numa aula de fisiologia o professor ter dito que nunca, em situação alguma, devíamos beber água só quando temos sede, porque nessa altura já estamos desidratados. Devemos beber água antes de ter sede.

Agora vou contar-vos o meu pesadelo que durou três meses. Quando regressei ao trabalho, já a pequena tinha nove meses, tive algumas dificuldades em organizar o tempo. Ter três filhos é efetivamente um desafio, especialmente para quem, como eu, gosta de estar sempre em cima de todos os acontecimentos. Com tanta coisa para fazer e a amamentação ainda muito regular acabei por passar mais tempo do que queria sem dar mama e comecei logo a sentir um ingurgitamento. Assim que cheguei ao pé da bebé, fi-la mamar com o queixo na direção do ingurgitamento. Em duas mamadas pareceu que a situação se tinha resolvido.

Dois dias depois surgiu um ponto branco no mamilo. Falei com algumas amigas, que me diziam que era leite e que teria de furar. Pensar em picar a mama é tudo menos agradável e, um bocadinho às cegas sem perceber o que tinha de fazer, acabei por não fazer nada. Dois dias depois estava cheia de dores e fui às urgências do hospital. Quando cheguei fui consultada e fiz análises, não acusou nada e aparentemente estava tudo bem. Fui atendida por uma consultora de amamentação, que me disse que devia mesmo picar a pinta branca do mamilo, que era leite acumulado e que estava solidificado e que tinha de picar para sair um género de esparguete. Como as dores eram fortes, fui insistente até que a médica pediu uma ecografia mamária, que acabou por acusar uma Mastite. Comecei logo a fazer antibiótico. Cerca de 40 horas depois regressei às urgências com dores insuportáveis e a mama completamente inflamada. A médica quando viu fez um ar aterrorizado e voltou a fazer os mesmos procedimentos para garantir que não estava com um abcesso. Felizmente não tinha abcesso, pediram-me para voltar no dia seguinte para terem a certeza de que o antibiótico começava a fazer efeito. Efetivamente começou a fazer efeito e o inchaço acabou por desaparecer.

Marcaram consulta para 10 dias depoispara terem a certeza que estava tudo bem e estava. Finalizei o antibiótico e andei três ou quatro dias bem.

Passado esse tempo comecei a ter uma sensação de picada horrível. Como ia para Portugal achei que deveria esperar para ir ao médico lá.

Quando cheguei a Lisboa, com dores terríveis, lá fui eu novamente para as urgências. Apertaram-me a mama para garantir que saía leite e disseram que não estava nada inflamado, que deveria ser uma nevralgia, para tomar paracetamol alternado com o iboprufeno durante três dias e que iria melhorar. Também me prescreveram uma ecografia mamária. Resolvi marcar uma consulta com um ginecologista para uma semana depois no Algarve.

Durante os três dias de tratamento estive realmente melhor, mas quando finalizei as dores tornaram-se insuportáveis. Consegui garantir que o médico me atenderia e que me faria a ecografia.

No dia em que tinha a consulta fui para o hospital, quando cheguei lá pediram muitas desculpas, mas que o médico tinha a filha doente e não me poderia atender.

Pedi para verem quando poderiam fazer a ecografia, para garantir que continuava tudo bem, porque as dores continuavam muito fortes. Disseram que poderiam fazer 4 dias depois e que o médico até estaria nesse dia de serviço e que provavelmente poderia falar com ele.

As dores não passavam e quando ia a caminho do hospital ligaram-me a dizer que o procedimento obrigava a que fizesse também mamografia. Questionei algumas vezes se podia fazer a mamografia mesmo estando a amamentar, disseram que sim e fiz a mamografia e a ecografia. O ecografista disse que estava tudo bem, mas quando pedi para falar com o médico disseram que só me poderia ver dois meses depois.

Saí do hospital em Albufeira cheia de dores e resolvi ir para um hospital com urgências ginecológicas em Faro. A médica disse-me que, por exclusão de partes, deveria ser um fungo e prescreveu-me fluconazol com uma dosagem de 100 mg e disse para voltar ao fim de 7 dias, se não estivesse melhor. Como sou sempre positiva fui achando que estava melhor e, como estava de férias, 7 dias depois já estaria em Lisboa. Como tinha tratamento para 14 dias marquei consulta no 14º dia, com o intuito de continuar o tratamento, porque parecia que estava a ficar melhor. Fizeram-me análises para garantir que estava tudo bem a nível hepático. Como estava bem continuei a tomar o fluconazol.

Durante todas as minhas férias li muito sobre o assunto, nem sempre as melhoras coisas, mas não encontrava artigos científicos. Nada em português e o que encontrava em inglês era muito genérico e inconclusivo.

Quando voltei ao Luxemburgo, quase por milagre, dei de caras com um artigo da médica Carolina Ferreira, onde descrevia um caso de candidíase (infeção por fungos) que parecia o meu. Quase dei pulos de alegria por finalmente ter encontrado algo concreto. Resolvi enviar-lhe um e-mail e uma hora depois tinha a resposta. Deveria ser avaliada novamente.

No artigo, que me parecia uma descrição do meu caso, dizia que a dose do tratamento inicial devia ser de 400mg e posteriormente 200mg. As dores não passavam e eu apenas tinha tomado 100mg diários em 25 dias. No dia seguinte fui novamente ao hospital. Acabaram por me aumentar a dose do fluconazol para 400mg no primeiro dia e depois 200mg por dia durante 15 dias.

Comecei a tomar as doses prescritas e as dores intensificaram-se, foram uns dias de sofrimento, até que resolvi voltar ao hospital.

Estive lá 4 horas e como já não dava mama há muitas horas pedi para tirar leite, com a esperança de que me pudessem analisar o leite. Quando finalmente fui consultada a médica queria dar-me paracetamol e iboprufeno. Disse que não, que não sairia dali, que esse tinha sido o tratamento há semanas e que nada passava e eu tinha dores insuportáveis. Depois de ir falar com a responsável a médica de serviço fez-me um rastreio no mamilo e enviou o leite para análise.

Entretanto consegui marcar consulta com uma médica de clínica geral que me tinham recomendado, por se interessar por este tipo de situações. Recomendou-me fazer pachos quentes, que ajudariam caso fosse uma nevralgia, a pomada Dr Jack Newman que é feita diretamente na farmácia, caso fossem fungos ou mesmo bactérias, tomar magnésio e vitaminas de amamentação. Nos primeiros dois dias em que coloquei a pomada senti muito alívio, mas depois voltei a sentir muito desconforto.

Cinco dias depois chegaram os resultados da análise do leite e afinal não tinha fungos nenhuns, tinha um crescimento moderado de staphylococcus aureus. Era necessário deixar de fazer o antifúngico oral, deixar a pomada e fazer apenas um antibiótico oral durante 7 dias.

Como estava escaldada com todos os acontecimentos anteriores marquei também consulta com uma especialista de amamentação que me tinham recomendado.

Quando os 7 dias terminaram as dores continuavam, parecia uma saga. A única solução que restava era mesmo a consulta que tinha marcada.

Não há muitos estudos científicos sobre amamentação porque o caminho mais fácil é sempre desistir. A dor foi insuportável, mas a minha motivação superou tudo.

Depois destes inúmeros tratamentos já parecia não haver dúvidas que o que eu tinha desde o início era um ducto mamário parcialmente entupido. Partilho convosco tudo o que me foi recomendado nessa última consulta com a especialista de amamentação:

  • Sessões de radiofrequência com um fisioterapeuta;
  • Depois de um banho quente, com um utensílio com uma pequena abertura, pressionar o mamilo como se espremesse uma borbulha;
  • Amamentar de gatas com o bebé deitado de barriga para cima e ir virando a posição, o bebé tem de ficar com o queixo na linha do ingurgitamento;
  • Massajar o local com uma escova elétrica;
  • Tomar lecitina, 1500 mg três vezes por dia durante um mês;
  • Privilegiar uma dieta de polinsaturados de origem vegetal;
  • Colocar o mamilo em sal de Epsom;
  • Ir a um dermatologista.

Saí de lá com esta lista, fui logo comprar tudo o que não tinha, cheguei a casa e amamentei de gatas durante bastante tempo. Não sei se teve ligação, mas a minha filha apanhou uma gastroenterite depois disso, mas as dores dos últimos três meses acabaram por desaparecer.

Se conseguiram ler até aqui é porque o assunto de alguma forma vos tocou e embora tenham sido três meses terríveis não me arrependo em nada de não ter abandonado a amamentação. Faltam estudos científicos porque quando há dificuldades as pessoas deixam de amamentar. Espero que o meu artigo que não tem nada de científico possa ajudar alguém a manter a motivação e a não desistir se for essa a vontade.

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