Desengasgar um filho bebé
Não tenho conseguido escrever, não por me esquecer ou por não ter assunto, mas simplesmente porque a gestão familiar, profissional, académica e social não é sempre fácil.
Quem tem filhos concorda certamente que existia uma vida e uma utilização do tempo sem filhos e outra completamente diferente e bem mais rápida com filhos.
Hoje vou contar-vos um episódio que vivenciei no outro dia e que acredito possa ser útil para quem o ler.
Fui almoçar com uma amiga a um centro comercial e com a minha filha mais nova, na altura com oito meses. Não sei se já mencionei, tenho um artigo para escrever sobre isso, mas tenho a «sorte» de ter crianças que gostam muito de comer. Prometo que não me esquecerei de vos contar porquê.
Levei comida para a minha filha, cozinhada, já partida e separada em caixinhas para ir abrindo para ela ir comendo sozinha.
Às tantas apercebo-me que a pêra não estava tão bem cozida como a maçã, porque tinham sido cozidas juntas e comecei a partir os bocadinhos ainda mais pequeninos. Ela continuava a comer muito entusiasmada. Até que pede para mamar.
Ponho-a a mamar, mas ela parece agitada e vai virando a cara, mostrando que não quer. Entretanto apercebo-me que tem alguma coisa que a está a incomodar na garganta, paro de falar com a minha amiga, e viro a minha filha para lhe dar umas pancadas nas costas, com ela apoiada nas minhas pernas.
Felizmente na Faculdade tive uma formação obrigatória em primeiros socorros e depois disso tive várias formações de «reciclagem» para relembrarmos a forma de atuar. O que relembro melhor de todas as formações que fiz sobre o tema é de ouvir os formadores dizerem «podemos salvar vidas». Curiosamente, a última formação que fiz foi durante a minha terceira gravidez, pelo que estava muito fresca na minha cabeça. De qualquer modo, o comentário que regularmente faço nessas formações é.. aqui sabemos tudo, mas será que numa situação real conseguiremos atuar?!
Voltando ao episódio, estava calmamente a dar-lhe pancadas nas costas quando uma senhora de uma mesa grita que ela está aflita. Mantive a minha calma, foi algo que aprendi com a vida, mas tenho aprimorado com a vinda dos filhos. Coloquei-a verticalmente, para perceber que efetivamente ela não tinha conseguido mandar fora, dava sinais de querer vomitar, puxei a minha cadeira mais para trás para ter mais espaço e voltei às pancadas nas costas. Às tantas a dita senhora, em histeria, diz que ela está a sufocar e tem de ir imediatamente para o hospital. Congelei por dois segundos e vieram-me nesse instante as palavras dos formadores à minha cabeça e lembrei-me da teoria, virei-a de barriga para cima ligeiramente inclinada com a cabeça para baixo para pressionar e voltar a virá-la para continuar as pancadas. Meti-a vertical e tentei com o meu dedo ver se conseguia remover aquilo que eu pensaria ser um bocadinho de pêra, mas não saía nada.
A dita senhora, que conseguiu fazer com que o centro comercial onde estávamos entrasse em alvoroço, aproxima-se e diz-me que eu estou a fazer tudo mal e pergunta se ela pode fazer. Eu continuava relativamente calma, mas obviamente que pensando que ela seria mais competente lhe passei a bebé para os braços. Assim que ela a tem nos braços diz que já não se lembra muito bem como se faz. Arranquei-a dos braços dela e comecei as manobras de reanimação embora ela não tenha estado um único segundo sem respirar. Um minuto depois já tínhamos o segurança do centro ao pé de nós e, quando se aproxima de mim a perguntar o que se passava eu tentei novamente puxar alguma coisa que estivesse na garganta, ela encosta-se a mim, tosse e atira fora um bocado de maçã que tinha entrado provavelmente no sítio errado. A ambulância chegou um minuto depois, fiquei surpreendida com o tempo de reação. Sei exatamente os tempos porque a minha amiga é que ligou para a ambulância no único momento em que não me sentiu calma e quando ela desligou o segurança já tinha chegado. E um minuto depois da chamada ser terminada os bombeiros já lá estavam.
Durante esse minuto voltei a sentar-me com a bebé no meu colo a responder às questões do segurança e a observar as imagens do meu ângulo de visão e percebi que há pessoas muito nervosas e que o problema provavelmente foi a autonomia que ela tem. Não sou obcessivamente fã do método BLW (Baby-Led Weaning) em que a criança come sozinha mas pratico-o desde sempre com os meus filhos e com a última mais do que com os primeiros dois. E fiquei a achar que foi mais fumo do que fogo e que a senhora tinha provavelmente muito tempo disponível.
Quando os bombeiros chegaram disseram-me que teria de os acompanhar, embora a bebé se estivesse a rir e a meter-se com toda a gente.
A minha amiga que apenas tinha ido almoçar comigo resolveu tirar a tarde e ir ter comigo ao hospital.
No hospital contei a história e disse que se tivesse sido em casa não teria ido para o hospital. Como lá estávamos e porque não podem correr riscos sugeriram despistar tudo, o que fizeram. A pergunta que mais vezes me colocaram foi: mas se ela nunca deixou de respirar e se estava a fazer o que diz como veio aqui parar? Uma excelente pergunta…
Aprendi que quando fazemos formações podemos ter dúvidas se conseguiremos agir nos momentos em que realmente precisamos e provavelmente sim. Caso não tenham formação em primeiros socorros aconselho vivamente a fazerem, se ainda não têm formação despendam alguns momentos a observar as imagens em cima.
Um obrigado muito especial à minha amiga que me acompanhou durante toda a situação e que só me dizia que queria um dia ter a capacidade de se manter tão calma num ambiente de histeria como o que vivenciámos.
Ficará para contar aos netos. Por aí algum episódio semelhante?
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