Futebol para os meninos e dança para as meninas?

Vivemos numa sociedade de estereótipos. A primeira questão que se coloca quando alguém está grávida é se é menino ou menina para se saber se se compram coisas azuis ou rosas. Embora enraizado, há obviamente quem não siga este estereótipo. Confesso que nunca me opus a essa “linha” e em certos momentos cooperei socialmente. Claro que com dois filhos de sexos diferentes não existem fundamentalismos e as cores deixam de ser importantes mas está tão enraizado que só pensamos nisso se nos “obrigarmos”.

 

Se é um menino podemos dar uma pista de carros

Passamos o tempo a defender que as crianças devem ter liberdade mas passamos o tempo a escolher por elas e a inibir as suas escolhas. A definir o que é bom e mau antes de lhes darmos opção. É uma menina? Então vou-lhe dar uma boneca. E porque não dar uma boneca a um rapaz? Porque não podem as meninas brincar com carros?

Certamente estão a ler e a pensar, isto é absurdo. Claro que os meninos podem brincar com bonecas e as meninas com carros. Mas será que podem mesmo? Será que enquanto sociedade não estabelecemos já o normal? Se alguém oferecer ao seu filho alguma coisa que não está na “norma” o que pensará?

 

Os brinquedos e as atividades não têm género

Infelizmente o nosso conservadorismo faz-nos achar que os brinquedos e as atividades têm género. A sociedade cria estereótipos que enquanto educadores devemos eliminar. As crianças devem brincar com o que quiserem, devem aliás ser convidadas a experimentar tudo para poderem saber o que realmente gostam e querem fazer.

Será que uma criança que gosta de brincar com alguma coisa que não seja o “normal” está feliz com as atitudes e opiniões sociais? Não terá direito a ser feliz e a fazer as coisas como quer e gosta?

Já fui expressando nos meus artigos que a meu ver devemos e temos constantemente que “balizar” mas será que temos o direito de o fazer com o socialmente aceite ou simplesmente com premissas que valham a pena?

 

Este estereótipo não tem nacionalidade

Relembro alguns episódios que vivenciei com algumas turmas que vou partilhar por achar que são um exemplo perfeito do que quero dizer. Estas situações foram vivenciadas em Portugal e no Luxemburgo, e sendo o Luxemburgo um país extremamente multicultural foram vivenciados por crianças de inúmeras nacionalidades. Escolher atividades por género é uma imposição social. Acredito na educação física como uma disciplina inclusiva em que todos, sem exceção, são convidados a participar, independentemente da aptidão que têm. Deve ser eclética e as crianças devem ter o máximo de experiências diferentes para se tornarem mais aptas fisicamente.   

 

O futebol é para os rapazes e a dança para as raparigas

Em todas as escolas onde estive senti alunos com aversão a atividades porque não se enquadravam no seu género. Lamento porque provavelmente quererá dizer que há muitos professores que seguem a mesma lógica. Nas minhas aulas a opção nunca foi a modalidade mas eventualmente o nível em que participam. Digo eventualmente porque por vezes não há opção mas cada um faz o que pode. Sempre fui muito apologista de aulas inclusivas onde todos participem e acima de tudo se divirtam. Que papel terá a educação física se as crianças não tiverem posteriormente vontade de se exercitar? Precisamos de pessoas que gostem de se mexer. A atividade física é fundamental em todas as idades.

Por a minha visão ser inclusiva todos os alunos participam em todas as atividades, muitas vezes começam por dizer que não gostam e no final apercebem-se e vem-me inclusive agradecer por os ter incentivado a fazer.

 

Para menina até joga muito bem à bola

A única constatação cientifica relativamente a género é que os homens têm mais força e as mulheres maior flexibilidade, no entanto essa premissa é genérica, não se confirmando sempre e só sendo uma realidade a partir de dado momento. Nas crianças isso não se verifica. Todas as crianças devem ter a oportunidade de realizar todo e qualquer tipo de atividade sem que lhe digam que isso é de meninas ou de meninos. Essas ideias não vêm da cabeça deles, vêm das nossas! Fico irritadíssima quando oiço frases do género: “para menina até joga muito bem à bola”. Se não joga melhor foi porque não foi incentivada quando e por quem deveria ter sido. Ser criança é simplesmente brincar e ser feliz, é querer experimentar tudo, é ter sede de aprender.

As crianças não precisam das nossas ideias pré-concebidas e de premissas antiquadas.

E sabem? Eu tenho um sonho!!! Deixar uma sociedade melhor, para os meus filhos e para os vossos...!

Comentários

  1. Gosto do teu sonho.

    Cabe aos pais inicial e principalmente dar segurança aos filhos para experimentarem de tudo. Se a criança sente segurança em si e no amor (não me refiro aquilo a que os pais chamam amor mas fazem os filhos depender em tudo deles sem lhes darem autonomia) que lhes é transmitido não terá receio das críticas quando entra na escola primária ou até antes na pré e percebe que é gozada por gostar de algo que não é socialmente imposto. Parece-me a criança quando brinca não está preocupada com o que a sociedade pensa sobre o seu brinquedo, está simplesmente a brincar. A infelicidade poderá aparecer quando a criança tem por perto adultos castradores que insistem em incutir um determinado comportamento.
    A minha preocupação enquanto pessoa nesta sociadade ainda retrógrada é o facto de deixar as crianças com as tecnologias existentes no mercado para não incomodarem os adultos (até parece uma ideia muito moderna). A vida é um corre corre mas há limites. Quando algo não agrada nas tecnologias as crianças trocam ou desligam mas socialmente não podem desligar o outro e é aí que surge o desentendimento, a frustração e o conflito. Vejo a incapacidade social dos jovens de forma preocupante. Ontem mesmo conversava com uma colega sobre as brincadeiras que se faziam antigamente, a conclusão a que chegamos é que as crianças brincam cada vez menos e não sabem brincar.
    As famílias eram grandes na sua maioria, vários irmãos, muitos primos e os jogos como as escondidas ou até à bola surgiam naturalmente mas hoje as famílias são cada vez mais pequenas, e tardam em conceber o projecto de serem pais. os pais que optaram por pais não sentem segurança para deixar o/os filhos brincar na rua e também não têm 'tempo' para brincar.
    Infelizmente, tenho ouvido comentários que não me fazem sentido mas respeito a individualidade de cada pessoa. Entre eles estão 'não vou estragar o corpo com uma gravidez' 'não quero ter filhos porque prefiro viajar' 'não estou disposta a ficar presa para o resto da vida' enfim! Conheceis muitos outros com certeza e todo esse pensamento que se vai enraizando faz com que haja menos crianças, logo menos possibilidades das crianças socializarem com os pares fora das escolas.

    Partilho do teu sonho, que passe a ser uma realidade quanto antes.

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  2. Esta é uma questão interessante e para a qual a investigação não apresenta dados muito claros, continuando a investigar a eterna questão do “nature vs nurture”.
    Não há dúvida que a forma como educamos é fundamental, mas a predisposição natural ou genética também contribui de forma significativa.
    Inúmeros estudos mostram que a percepção da realidade é significativamente diferente no cérebro masculino e feminino e consequentemente os gostos e aptidões vão centrar-se nessa percepção, independente dos esforços para a uniformidade.
    Apesar disso, e enquanto mãe de rapazes e rapariga, sempre sugeri que experimentassem as atividades antes de tomarem uma decisão. Os três praticam artes marciais, nenhum mostra aptidão ou inclinação especial para o futebol, mas os 3 quiseram jogar rugby. Os rapazes ainda jogam atualmente e a filha experimentou durante uma temporada e decidiu que era demasiado violento para ela.
    Os três experimentaram dança ( ela e o mais velho ballet, o do meio hip-hop) e ainda hoje tem dança moderna na escola.
    Todos são fãs da Lego e brincam aos piratas e aos mosqueteiros juntos.
    Isso não impede a filha de ter vestidos de princesa e os rapazes de terem usado fatos de super-herói.
    Nunca impusemos cores ou estilos de vestir, e pessoalmente, odeio lantejoulas e folhos, mas a filha é sempre atraída para isso sempre que estamos numa loja.

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