Eu bem te avisei que ias cair!

 

“Não”, é provavelmente a palavra que os adultos mais dizem às crianças: não mexas aí, não faças isso, não digas isso (não, não, não!). E porque não? Porque não podem as crianças mexer ou fazer ou dizer? Às vezes o « não » está de tal forma por baixo da língua que nem perdemos tempo a observar a razão do « não ».
No outro dia quando fui buscar os meus filhos à creche ouvi uma mãe dizer « não corras que ainda cais!», a criança caiu e a mãe correu para levantar a menina do chão e completou « eu bem te avisei que não devias correr ».
Escusado será dizer que fiquei chocada! Uma criança de três anos que não pode correr? Porque pode cair? As crianças devem correr e devem cair. Devem gostar de se mexer e os adultos tem como função incentivá-las a mexerem-se, cada vez mais, a ousarem testarem-se fisicamente para poderem cair muito e serem felizes, superando-se a elas próprias.
É necessário « pesar » o grau de perigosidade das situações. Porque não pode a criança correr? A resposta das crianças às quedas depende da reação dos adultos. Se quando uma criança cai, o adulto cuidador for a correr levantá-la não está a ajudar na autonomia e está a dizer-lhe « quando caíres estarei aqui sempre para te proteger e para te levantar » e a minha questão é: estará sempre fisicamente presente? Não vai deixar a criança crescer? Se analisar a situação e, quando é apenas uma queda inconsequente brincar com a situação e, disser para se levantar a criança irá aprender a reagir a uma queda inconsequente. Quando for verdadeiramente uma queda dolorosa vai perceber melhor do que a criança que se queixa independentemente da queda.

Ainda se lembra como era consigo? Também tinha sempre alguém a levantá-lo(a)? Não tinha vontade de ser “independente”?
Da próxima vez que vir uma criança cair observe o seu comportamento e a atitude de quem a acompanha, tire as suas conclusões e diga-me o que achou.

Voltando ao “não”... sugiro-lhe que faça um exercício. Contabilize o número de vezes que diz « não » nas próximas duas horas que estiver com uma criança, aponte o número de vezes e a situação. Quando finalizarem as duas horas analise quantos desses "nãos" foram injustificados. Provavelmente muitos deles... vamos deixar as crianças crescer? Limitar os “nãos” aos estritamente necessários. Porque é que o seu filho não pode ajudar na cozinha? Porque é que não pode correr? Porque é que não pode ajudar? Porque é que não pode tocar? Porquê?


Na rubrica « tenho muita sorte » vou dar um exemplo que me é muito próximo. O meu filho começou a comer com pratos de loiça quando tinha um ano e pouco. Na realidade praticamente não comeu com pratos de plástico.

Começámos a incutir também muito cedo que ajudasse a tirar a loiça da máquina. Obviamente que tinha receio que partisse o prato e se magoasse, ele mostrava confiança quando se deslocava mas temos sempre receio, e até uma certa desconfiança, mas não lhe dizia que não. Acompanhava-o de perto e dizia para mim própria «confia, ele precisa de sentir a tua confiança ». Conclusão: partiu duas coisas até hoje, não me lembro de mais e quando as partiu ficou muito mas muito mais chateado do que eu. De referir que a minha atitude foi dizer que acontecia mas que tínhamos de ter cuidado para não voltar a acontecer. Lembro-me que na segunda vez que aconteceu ele também fez questão de ajudar na limpeza do que tinha partido. E porque não? Sem negligências mas respeito.

Quais as razões de não deixarmos as crianças participar? Vamos ter a capacidade de adaptar as coisas à idade das crianças e incentivá-las a participar? Não queremos que cresçam rápidos mas queremos que cresçam felizes e capazes.

Uma ultima frase para vos dizer que se acreditarem nas capacidades das crianças e lhes incutirem esse acreditar as farão ser muito mais confiantes e seguras de si. Vale a pena tentar.

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